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Notícias - Polícia - Rio - 5 de julho de 2011

Tratamento obrigatório para crianças dependentes de crack no Rio é alvo de críticas severas de especialistas



O tratamento obrigatório de crianças e jovens viciados em crack em abrigos, projeto implementado pela Prefeitura do Rio há cerca de um mês, foi alvo de duras críticas feitas por representantes de 85 entidades de defesa dos direitos das crianças e dos conselhos regionais de Psicologia e Serviço Social durante uma reunião realizada na tarde desta segunda-feira (4).

Em maio, a Prefeitura do Rio criou o “Protocolo de Abordagem à Pessoa em Situação de Rua”, que determina que todos os menores recolhidos nas ruas e que sejam dependentes químicos, principalmente de crack, sejam obrigados a se tratar.

Entretanto, assistentes sociais, psicólogos e integrantes de organizações não governamentais afirmam que o recolhimento compulsório apenas tem tirado as crianças das ruas sem oferecer tratamento médico e pscológico adequado e que o projeto, gerido pela Secretaria Municipal de Assistência Social, deveria ser realizado em parceria com profissionais especializados em saúde mental que a própria prefeitura dispõe em seus quadros, mas que não estão participando do programa.

Integrantes do setor de fiscalização dos dois conselhos, que visitaram o recém-inaugurado abrigo Casa Viva, projeto piloto criado pela prefeitura para receber os meninos e meninas retirados das ruas, afirmam que o local não tem estrutura física e profissionais adequados para tratar dependentes químicos e denunciam que a atual abordagem se assemelha aos antigos manicômios, modelo de tratamento psiquiátrico banido no país há mais de 20 anos.

Representante da Rede Rio Criança, que reúne 25 entidades de defesa dos direitos de crianças e adolescentes, Márcia Gatto afirma que a “a ampla equipe multidisciplinar anunciada pela Secretaria de Assistência Social não existe” e que não há um psiquiatra, mas apenas um clínico geral para tratar dos pacientes.

– Nos pareceu uma experiência nada acolhedora. Mais parece um encarceramento. Os garotos passam a maior parte do tempo vendo TV quando não estão dopados. Não existe estímulo ao vínculo familiar e as crianças não têm acompanhamento quando recebem alta.

Polêmica

As ações de recolhimento em operações nas chamadas cracolândias com uso da força também foram alvos de duras críticas porque, segundo o grupo, desrespeita as recomendações da Política Nacional de Saúde Mental e impossibilita uma abordagem social, como explica Hilda Correa de Oliveira, membro do Conselho Regional de Serviço Social.

– O grande equívoco é a falta de articulação com a área de saúde mental. O ato de abordagem nunca pode ser acompanhado de força policial porque é preciso criar uma relação de confiança e diálogo com os dependentes. O atual modelo de abordagem não pode ser caracterizado como social, mas de força.

 Polêmica, a medida tem dividido especialistas. Juristas e a própria OAB-RJ (Ordem dos Advogados do Brasil) afirmam que a medida fere a Constituição e desrespeita o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Especialistas em tratamento de dependência química ponderam que somente a internação forçada não resolve o problema, e que, se não houver um tratamento adequado, as crianças fatalmente vão voltar para as ruas.

Em seu blog, o desembargador Siro Darlan, conhecido por sua atuação no Juizado da Infância e Juventude do Rio na época da implementação do ECA, faz críticas contundentes à medida e afirma que “o município há 21 anos descumpre a lei de proteção integral à infância”. Darlan acusa as autoridades municipais de desrespeito ao ECA e negligência ao deixar de cobrar sua efetiva aplicação.

“É claro que ninguém quer crianças usando drogas, mas o que está errado é deixá-las sem família, sem escolas, sem creches, sem respeito, perambulando pelas ruas sem destino por falta de equipamentos que as tratem com respeito e dignidade”.

Um relatório elaborado pelo grupo será entregue para vereadores, deputados e prefeitura nos próximos dias, e uma carta assinada por diversas entidades será encaminhada ao Comitê Olímpico Internacional, que acompanha e fiscaliza as ações do município voltadas para a realização dos Jogos de 2016.

Secretaria diz que projeto já é modelo 

Após ganhar notoriedade como o “xerife do Rio”, por criar as operações de combate à desordem urbana quando esteve à frente da Secretaria de Ordem Pública, o atual titular da Assistência Social, Rodrigo Bethlem, acusou os críticos de “falarem sem conhecimento de causa”. Ele afirma que o programa é feito de maneira compartilhada com a Secretaria Municipal de Saúde e que a Casa Viva  tem psiquiatra, psicólogo, terapeuta ocupacional, enfermeiros, assistentes sociais, cozinheiro e assistente de cozinha, além de educadores.

– O maior problema é falarem sem conhecimento de causa. Não é internação. É um abrigo compulsório, obrigamos a ficar em um abrigo. É uma gestão compartilhada com a saúde. Aceito crítica, é valida, mas para falar tem de conhecer.

Bethlem disse que as crianças praticam atividades na casa e que frequentemente são levadas para passeios. No último sábado (2) os internados na Casa Viva foram visitar a Cidade da Criança, segundo o secretário.

Ainda de acordo com Bethlem, as operações para recolhimento dos menores nas ruas têm de ser feitas com o acompanhamento da Polícia Civil – a DPCA (Delegacia de Proteção à Criança e Adolescente) – porque entre os adolescentes podem existir criminosos. Segundo ele, desde o início das operações, já foram encontradas mais de cem pessoas que tinham mandados de prisão expedidos.

Bethlem afirmou que as famílias acompanham o tratamento dos adolescentes e que nenhum dos internados já teve alta e que também haverá um acompanhamento para reinserção social e familiar daqueles que saírem da instituição.

Segundo ele, as secretarias Municipais da Saúde e de Assistência Social, além do Ministério Público do Rio, têm sido procuradas por governos de vários Estados do país para que o programa seja implantado em outros lugares.



Fonte: Portal R7

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